A 19º edição da Copa do Mundo, que terá início no dia 11 de junho, traz à tona toda a “cerimônia” que se faz presente no ambiente que envolve o maior torneio de futebol do planeta. Sente-se no ar toda a atmosfera da competição, e durante um mês, não se fala em outra coisa. Acontecimentos relevantes, desastres naturais (que infelizmente viraram corriqueiros), e até um ataque terrorista em algum grande centro tendem a ficar em segundo plano, tendem a ser apenas coadjuvantes nos noticiários, já que a seleção venceu o jogo e caminha firme rumo ao título.
E é justamente nessa época que floresce a idéia de amor a pátria na cabeça do brasileiro, o país se transforma no mais importante entre todos os outros, até porque somos pentacampeões do mundo, que outro país pode se gabar disso? Camisas amarelas são vistas em montes nas ruas, ruas são pintadas com as cores do Brasil, um sentimento saudável, sim, mas que esconde uma leve hipocrisia.
Se a seleção ganha, abocanha mais um título mundial, fica tudo lindo, somos mesmo a maior potência futebolística, e por que não esportiva, do mundo, e surgem ai mais heróis nacionais. “Que orgulho de ser brasileiro”. Assim curtimos um pouco da ressaca pós-título, já que a comemoração é prolongada, regada a tudo que é de direito. Mas, se perde, a se perde, nem se pensa nisso, mas perdeu, então, caça as bruxas. “A culpa é dele, tenho CERTEZA, que seleção de mer**, técnico burro”. Sobra até pro meião do atleta que não tinha incumbência de marcar ninguém, mas como somos todos especialistas, não tem desculpa.
“Fenômeno” parecido vemos nas Olimpíadas. O ginasta, dessa vez citando nomes, Diego Hipólito, treina sem apoio nenhum do governo, que não incentiva nenhum esporte considerado desinteressante pela população, num clube do qual não recebe, e isso sempre no ostracismo oferecido pela mídia esportista, já que um título fora das olimpíadas rende imensos 5 minutos em algum programa de TV, ou uma nota no jornal.
Mesmo assim o rapaz chega à final em Pequim com banca de favorito, mostrou que é bom no solo, e aí sim, somos todos fãs dele, torcemos de mãos dadas pela sua apresentação. Mas como sabemos, ele escorregou, e a reação do brasileiro é a pior possível, tratamento oferecido como perdedor, como se fosse obrigação dele trazer uma medalha para o BRASIL, torcemos tanto por ele oras, fizemos nossa parte, ele não. “Brasileiro é mesmo cagão, olha o chinês, frio, não erra um movimento.”
Já o nadador César Cielo, ídolo nacional com todos os méritos, treinou para as olimpíadas no estrangeiro, na estrutura que os EUA oferecem, ao lado de outros monstros, seus rivais da natação. Conquistou o mundo com seu carisma e talento, trouxe medalha, bateu recordes. “AH! Que orgulho de ser brasileiro²”.
Historicamente...
... O governo sempre soube se utilizar desse patriotismo inconstante por interesses próprios. Na Copa de 70, primeira transmitida a cores, para quem podia, obviamente, a ditadura comemorava três anos do sucesso AI-5, Ato Institucional que privava o cidadão de ter opinião própria, punindo e “reprimindo”, por assim dizer, de forma leve, qualquer cabeça pensante. Tínhamos um futuro certo, um futuro grandioso, que apenas nos esperava, e o começo de tudo estava ali, representado nos pés de Pelé, Tostão e uma infinidade de talentos. Pra frente Brasil, vamos todos juntos, SALVE, SALVE, a seleção, e a pátria. Bom, pelo menos era isso que o presidente da época, Médici, insinuava.
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Nada contra o clima de festa da Copa do Mundo, muito pelo contrário, a integração que ela promove traz apenas pontos positivos, principalmente para o país sede, e assim como na África do Sul, se o projeto da Copa no Brasil for feito de forma inteligente e honesta, o país só tem a ganhar com isso. O que pode sim, ser mudado, é a idéia de ser brasileiro apenas através da seleção, como se o país fosse um time, como se não tivesse nada a ser mudado por aqui enquanto a seleção canarinho joga, e vence, pois se não vence...